No plano nacional o ano abriu com o referendo do aborto que resultou na vitória (apesar de tudo) esperada do "sim". Foi um referendo marcado pela confrontação de pontos de vista divergentes, mas com confrontação mais moderada que no anterior onde o "não" havia ganho. O referendo permitiu também aos gato fedorento uma das melhores piadas do ano - a paródia com Marcelo Rebelo de Sousa.
A Justiça em Portugal também parece seguir pelas ruas da amargura. Casos mediáticos como o processo casa pia ou o apito dourado parecem estagnados sem resolução à vista, e o caso muito badalado do desaparecimento da menina inglesa Maddie segue pelo mesmo caminho - ao que parece, o ministério público nem conseguirá formalizar qualquer tipo de acusação sobre quem quer que seja. Isto, recorde-se, após ter escorrido tinta nos jornais de solidariedade para com os pais, seguido de um enorme repúdio para com os mesmos no momento seguinte quando foram constituidos como arguidos.
José Sócrates parece rumar tranquilamente para o segundo mandato em 2009. Não é que o ano tivesse passado sem alguma mossa. A começar na questão menor, mas mal gerida, da licenciatura de engenharia civil na universidade independente. Depois nos tiques autoritário que o nosso primeiro aparenta (o caso Charrua foi um exemplo disso). As trapalhadas dos ministros Mário Lino (um jamais que fica para a história) e Manuel Pinho (a do allgarve, por exemplo). Contudo, José Sócrates mantêm o dominio dos meios de comunicação social que lhe permitiram manter o PS no topo destacado das sondagens. Diga-se que, a esse propósito, também houve muito pouco trabalho da oposição para contrariar a festa socialista...
A história da oposição este ano foi feita de novidades que nada de novo acrescentaram. No CDS-PP viram-se livre de Ribeiro e Castro e fizeram ressurgir Paulo Portas. No PSD mandaram embora Marques Mendes e deram o posto a Luis Filipe Menezes, sendo que este trazia consigo colado, qual fénix renascida, Santana Lopes. O que está à vista é que nenhum dos partidos saiu a ganhar o que quer que fosse com tal mudança - e suspeito que a esperança de qualquer um deles é a mesma de muitos outros que lhes antecederam: é Sócrates quem terá de perder as eleições, não serão Menezes ou Portas a ganhá-las.
Por Portugal também passou a presidência da UE nestes últimos seis meses do ano. Ao que dizem por aí foi um sucesso. Permitam-me discordar. Muitas palavras e pouco conteúdo, foi o que foi. De mais marcante fica o tratado de Lisboa - mas esse ainda não foi verdadeiramente discutido em Portugal, e espero seriamente que ainda o venha a ser.
Aproveitando a deixa da União Europeia passo para a politica internacional, onde a UE continua a ser vista como uma carta fora do baralho - e diga-se que por motivos óbvios (que não será o novo tratado a mudar) percebe-se porquê. No panorama internacional, em primeiro lugar, há que destacar as alterações de liderança ocorridas em dois dos mais importantes paises europeus. Em França ganhou Sarkozy e verdade seja dita que espirito de iniciativa não falta ao homem, fazendo uma comparação com o seu antecessor, afirmo convictamente que a França saiu a ganhar. No Reino Unido Tony Blair saiu de cena, sendo substituido por Gordon Brown - este já não me convence, e pelos factos dos últimos dias também não deverá convencer os britânicos.
Na cena internacional, deu-se a passagem de testemunho entre Fidel Castro e Hugo Chávez, com este último a assumir a liderança do grupo pelo socialismo do século XXI da região sul americana - ao mesmo tempo Chávez teve a sua primeira grande derrota desde que assumiu o poder na Venezuela, um claro sinal de esperança. Chávez para consolidar o seu poder usou do dinheiro do petróleo beneficiando dos preços elevados, mas há outro dirigente mundial que disso tem-se servido para fazer ressurgir o seu país na escala mundial: é esse dirigente Vladimir Putin. A Rússia, ao contrário de algumas previsões, é um país a tomar em conta no tabuleiro do xadrez da politica internacional no futuro próximo.
Outra questão importante foi o desenvolvimento do projecto nuclear iraniano - mas esse segundo novas informações estará em lume brando... será mesmo? Cá por mim, suspeito que para o ano existirão novidades. Um caso bicudo para os americanos continua a ser o Iraque, mas esse problema já eles tinham no inicio de 2007 e não foi este ano que o solucionaram. Em 2008, mesmo por força das eleições norte-americanas, deverão existir novidades também neste campo.
O conflito israelo-palestiniano conheceu uma evolução, se bem que o impacto de tal evolução ainda seja dificil de decifrar. Ao contrário dos anos anteriores, este não foi só marcado pela oposição entre israelitas e palestinianos, mas acima de tudo por divisões internas entre os palestinianos que resultaram no surgimento de duas zonas distintas: a faixa de gaza liderada pelo Hamas, a cisjordânia liderada pela Fatah. O impacto global que tal situação terá nas relações entre as partes em questão ainda é dificil de decifrar, mas parece-me que Israel - por muito que muitos tentem escamotear - saiu claramente com maior legitimidade e poder negocial por força dos acontecimentos recentes.
Leitura recomenda: O Ano em Revista (Desporto)
|